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Privatização de espaços públicos. Você é a favor?


Por Rodrigo Vargas de Souza Publicado 30/11/2019 às 03h00
 Tempo de leitura estimado: 00:00

Há alguns meses, Porto Alegre passou a fazer parte de um projeto nacional chamado Ruas Completas. Dez vias de dez cidades do país foram escolhidas para servir de modelo à replicação do conceito de Ruas Completas. A rua João Alfredo é uma delas. Essas ruas são desenhadas para dar segurança e conforto a todas as pessoas, de todas as idades, usuários de todos os modos de transporte. O conceito tem como base distribuir o espaço de maneira mais democrática, beneficiando a todos (saiba mais).

No entanto, esse é um conceito novo, ainda mal compreendido por grande parte da população. Foi o que pude perceber durante um evento que participei durante um sábado na rua em questão. Desde a nossa chegada, logo pela manhã, foi possível sentir uma certa animosidade por parte dos comerciantes e moradores que eventualmente passavam pelo local. Mas foi com a chegada do prefeito, mais ao final da manhã, que o clima realmente esquentou. Das janelas e sacadas dos prédios era possível observar moradores que esbravejavam xingamentos de toda a ordem, transeuntes que vociferavam solicitando explicações sobre as mais diversas demandas, e até mesmo um inconveniente bêbado que não parou de soprar a sua “vuvuzela” durante todo o evento.

Mas, a solicitação que mais repercutiu naquele evento foi a daquele senhor careca e de chinelos que, não contente com as explicações nem do gerente de operações de trânsito e nem com as do próprio secretário de mobilidade da cidade, não descansou enquanto não foi ouvido pelo próprio prefeito. E lá ficaram, de pé, em meio a uma pequena multidão de curiosos, por aproximadamente uns 30 ou 40 minutos. De longe eu observava a situação e tentava ler através da linguagem corporal dos dois qual seria o desfecho da conversa. E quanto mais um explicava, mais o outro parecia cobrar explicações.

Até que o demandante pareceu se dar por convencido e liberou o prefeito para continuar sua peregrinação de cumprimentos e novas explicações. Até chegar, algum tempo depois, onde estávamos um colega e eu. Ao cumprimentar meu colega, proferiu algum comentário carregado de indignação por conta das críticas recebidas durante o evento. Ao cumprimentá-lo, tranquilizei-o dizendo:

As pessoas são mesmo engraçadas… Imagino que seja natural que fiquem confusas ou inseguras com a mudança, já que nem mesmo entre nós, que trabalhamos com mobilidade, há um consenso! Mais cedo, durante a montagem do evento, conversava com uma colega que dizia achar uma sacanagem aquele tipo de intervenção na cidade (devido ao espaço de estacionamento “tirado” da rua e transformado em área de convivência), já que, naquela zona, a grande maioria dos edifícios não contavam com garagem devido ao fato de serem antigos. Tirar a única possibilidade de estacionar daqueles moradores (segundo ela) não parecia algo razoável. Perguntei então a ela se, caso ela comprasse um lindo sofá novo que, devido às suas proporções, não coubesse na sua sala, ela acharia razoável deixar o sofá na calçada em frente ao prédio? Ela pareceu surpresa com a pergunta e, sem entender, perguntou o que aquele exemplo tinha a ver com as vagas de estacionamento. Bem, no meu ponto de vista tudo! É simplesmente um espaço público que está sendo utilizado para guardar um bem particular.

Mal eu terminei de falar e eles se entreolharam, o prefeito e seu assessor (creio eu), e ele respondeu “É uma boa analogia! Deveria ter dado esse exemplo pra aquele senhor careca…”

Em minhas palestras, quando pergunto aos espectadores “de quem é a rua?” muitos tendem a responder “de ninguém”; alguns, no entanto, dizem “é da prefeitura”. Mas, dificilmente ouve-se a resposta esperada: a rua é um espaço de todos. Logo, por todos deve ser utilizada. Até quando vamos continuar “privatizando” espaços públicos para alguns usuários em detrimento da grande maioria?

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