Em alguns estabelecimentos comerciais é possível encontrar vagas especiais destinadas às mulheres grávidas. Essa situação é regulamentada por lei? Veja a resposta!
No que diz respeito às reservas de vagas, a legislação estabelecida no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) prevê apenas reserva de vagas em vias públicas e particulares somente para idosos e deficientes físicos. No entanto, em alguns shoppings já existem vagas de estacionamento destinadas às mulheres grávidas.
Mas, como é feita a fiscalização desse tipo de serviço? Que critérios mínimos os empreendimentos devem ter ao definir o início desse projeto? E, quanto aos cuidados? Quais devem ser tomados para que não haja possíveis conflitos entre as partes?
Essas e outras dúvidas foram esclarecidas pelo advogado especialista em trânsito, Marcos Zanetti, membro da Associação Brasileira dos Advogados de Trânsito – ABATRAN.
Acompanhe o detalhamento do especialista.
Portal do Trânsito – O que diz a legislação sobre reserva de vagas para mulheres grávidas?
Marcos Zanetti – Quando se fala em reserva de vagas, estamos falando das regras do Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97), e na referida lei federal não há qualquer norma explícita que garanta a reserva de vagas para gestantes, bem como não há nenhuma normatização do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) neste sentido.
Portal do Trânsito – Em alguns shoppings, já há reserva de vagas para gestantes. Diante disso, por favor nos explique quais critérios mínimos os empreendimentos devem ter ao definir o início desse projeto?
Marcos Zanetti – Em muitos shoppings existem estes estacionamentos, mas, como dito, não há na lei federal (CTB) tratativa desta obrigatoriedade, logo o shopping não está obrigado a fazer este tipo de reserva de vaga.
Todavia, existem dois motivos para a implantação deste tipo de vaga nos estacionamentos dos shoppings. O primeiro se dá por uma questão de iniciativa própria da administração objetivando o bem-estar e os cuidados com a gestante. E o segundo, diante da existência de alguma lei municipal ou estadual que, diga-se de passagem, caso exista é inconstitucional. Aí cabendo a cada estabelecimento interessado em adotar a postura que lhe convém no seio jurídico.
Portal do Trânsito – Há algum tipo de fiscalização nesse tipo de estacionamento reservado para mulheres grávidas?
Marcos Zanetti – A fiscalização de trânsito tem como fonte a Lei nº 9.503/97 e não há nessa lei federal, explicitamente, nenhuma proibição que possa gerar uma multa de trânsito, com enquadramento específico, caso se estacione em vaga de gestante nos shoppings. Não há preceito primário, ou seja, uma regra que possa gerar uma pena em caso de não cumprimento.
Todavia, naquelas leis locais, seja municipal ou estadual, pode existir remissão a um dos incisos do Art. 181 do CTB, obrigando a um agente da autoridade de trânsito autuar o suposto infrator. Mas como dito, tal regramento é inconstitucional.
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Portal do Trânsito – O benefício do estacionamento é válido somente se as motoristas estiverem grávidas? Ou também se estiver como carona no veículo ou em transportes por aplicativo?
Marcos Zanetti – Não há previsão legal no CTB para tal. Entretanto, caso existisse, com certeza a regulamentação do Contran faria tal previsão, a exemplo, a Resolução nº 965, de 17/05/2022, que define e regulamenta as áreas de segurança e de estacionamentos específicos de veículos, conforme seu Art. 3º, que as áreas de estacionamentos para veículo de pessoa com deficiência são destinadas a veículos conduzidos por, ou que transportem, pessoas com deficiência, com comprometimento de mobilidade, devidamente identificados por uma credencial.
Portal do Trânsito – De que forma os shoppings devem ou podem exigir a comprovação da grávidas para terem direito a usufruir da vaga de estacionamento, sobretudo se estiver no início da gestação?
Marcos Zanetti – Independentemente da inexistência de dispositivo de lei federal tratando do assunto, os shoppings, para aqueles que possuem tais vagas, não têm poder de polícia de trânsito para fazer qualquer tipo de exigência.
No caso de os shoppings cumprirem alguma lei local, no máximo, eles terão a obrigatoriedade de implantar a sinalização vertical e horizontal de trânsito. No entanto, nunca fiscalizar ou exigir qualquer coisa do condutor. Na melhor das hipóteses, a administração do shopping pode fazer algum tipo de campanha de conscientização no estabelecimento.
Portal do Trânsito – Pensando na prevenção jurídica, quais são os cuidados para que não haja possíveis conflitos entre as partes?
Marcos Zanetti – Havendo a implantação de vaga exclusiva para gestante, se por iniciativa ou por obediência à lei local, esta deve estar bem sinalizada para que o condutor possa exercer um princípio moral e não estacionar no local reservado à gestante.
Portal do Trânsito – Como devem proceder os estabelecimentos que tenham interesse em oferecer esse benefício às gestantes? Qual é o passo a passo para iniciar o projeto?
Marcos Zanetti – Considerando a inexistência de lei federal obrigando à implantação de vagas para gestante, o shopping, por iniciativa própria, pode fazer uma previsão de reserva, devidamente sinalizada, a gestantes. É óbvio que um profissional competente na área de engenharia de trânsito deverá elaborar tal projeto. Agora, no cumprimento de alguma lei local, o shopping deverá seguir os parâmetros traçados na referida legislação. Dessa forma, realizando as obras necessárias para a implantação da vaga de gestante.
Portal do Trânsito – Há algo mais que o senhor acha importantes destacar sobre o assunto?
Marcos Zanetti – Nesta oportunidade, afirmo que há um descaso em desfavor da gestante, já que o Código de Trânsito apenas prevê a penalidade de multa e remoção do veículo para quem estaciona nas vagas reservadas a pessoas com deficiência ou idosos.
Há necessidade de que se os legisladores e o Contran resolvam tal situação. Isso porque a Lei nº 13.146/15 (Estatuto da Pessoa com Deficiência = Lei de Acessibilidade) trata a gestante como sendo pessoa com mobilidade reduzida, já que certas barreiras físicas podem comprometer a vida da mulher e do nascituro.
Deve-se garantir à gestante a acessibilidade com segurança e autonomia de espaços mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, em instalações abertas ao público, ou privados de uso coletivo.
A gestante pode apresentar, em muitos casos, fatores que possam dificultar sua movimentação, mesmo que temporariamente, gerando redução efetiva de sua mobilidade. Nos termos do Art. 53 da Lei nº 13.146/15, a acessibilidade é direito que garante à pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida viver de forma independente. Além disso, exercer seus direitos de cidadania e de participação social.
Aliás, faço aqui uma crítica acerca da insensibilidade jurídica do Contran. Isso porque na Resolução nº 965, de 17/05/2022, que define e regulamenta as áreas de segurança e de estacionamentos específicos de veículos, poderia em observação ao Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei de Acessibilidade), combinados como Art. 1º, § 5º , Art. 2º e inciso XX do Art. 181, todos do CTB, regular naquela resolução o cometimento de infração para quem estaciona na vaga de gestante.
Logo, com boa vontade, é possível resolver a questão da regulamentação, a nível nacional, de vaga de estacionamento para mulheres grávidas.