Blitz em ciclovia: ação necessária ou dispensável?

O objetivo de uma blitz em ciclovia é conscientizar os ciclistas sobre legislação e equipamentos de segurança para diminuir os riscos no trânsito.


Por Pauline Machado

No final do ano passado, a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) realizou uma blitz em ciclovia para usuários de bicicleta entre as avenidas Ipiranga e Erico Veríssimo, em Porto Alegre. A ação fez parte do Projeto Ciclista Seguro, realizado em parceria com a Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana (SMMU) e chamou a atenção por ser uma situação que não ocorre com frequência.

Segundo a EPTC, trata-se de uma operação rotineira com objetivo de conscientizar os ciclistas e dar dicas de segurança, bem como informar quais tipos de equipamentos são recomendados para diminuir os riscos no trânsito.

Mas, será que blitz em ciclovia vai virar rotina? O que diz a legislação sobre esse tipo de fiscalização? Quais são as vantagens e desvantagens de ações dessa natureza?

Essas e outras questões foram esclarecidas pela especialista em Trânsito e Mobilidade Urbana Mércia Gomes.

Acompanhe e deixe a sua opinião!

Portal do Trânsito – O que diz a legislação sobre a prática de blitz?

Mércia Gomes – O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) sofreu alteração na lei que define as remoções de veículos em blitz. Foi inserido o parágrafo 9°A, no artigo 271, que prevê a permissão para que o condutor parado pela fiscalização de trânsito não tenha o veículo removido se a irregularidade for sanada no local. Todavia, não possui dispositivo de blitz para bicicletas, salvo casos específicos em que os agentes orientam e nas bicicletas elétricas, ou seja, uma blitz educativa que possui o caráter de nortear e esclarecer a respeito da legislação, equipamentos de segurança e sentido correto na direção.

Portal do Trânsito – E sobre o uso de ciclovias?

Mércia Gomes – O Brasil tem mais de 4 mil km de ciclovias e ciclofaixas. Ao todo são 4.146,38 km só nas capitais brasileiras. De acordo com o ranking, São Paulo está no topo com quase 700 km de vias exclusivas na capital.

Uma ciclovia ou pista ciclável é um espaço destinado especificamente para a circulação de pessoas utilizando bicicletas. Há vários tipos de ciclovia, dependendo da segregação entre ela e a via de tráfego de automóveis.

A ciclovia é uma pista que se localiza separadamente da via destinada à circulação de automóveis. Isso significa que há um espaço, um desnível, um nível, um canteiro, uma grade ou qualquer outro elemento físico entre a ciclofaixa e a pista do tráfego pesado.

Quem vive nas grandes capitais já viu uma ciclovia em meio a importantes avenidas. Esse é o caso da famosa ciclovia da Avenida Paulista e da Avenida Sumaré, em São Paulo, por exemplo. Contudo, esse tipo de via também é comum em parques e outros espaços públicos.

Portal do Trânsito – Pensando no Brasil e no perfil dos ciclistas, quais são os prós e contras da ação realizada pela EPTC, em Porto Alegre?

Mércia Gomes – A operação ocorrida foi educativa e tem como pontos positivos orientar e conscientizar os ciclistas, além das dicas de segurança, bem como informar quais tipos de equipamentos são recomendados para diminuir os riscos no trânsito. Vale destacar positivamente que a orientação e conscientização, em forma de blitz, também alerta condutores que ultrapassam limites e outros ciclistas que conduzem de forma irregular a bicicleta, o que pode gerar acidente.

Ainda quanto aos apontamentos pró, destaca-se a conexão entre ciclista e legislação de trânsito, pois a maioria desconhece a legislação. Neste sentido, cabe mencionar que as regras que integram o CTB, direcionadas aos ciclistas, servem para assegurar o direito de ir e vir de bicicleta e também a segurança do trânsito como um todo. Estipulando, por exemplo, alguns direitos e deveres dos motoristas em relação aos ciclistas e dos ciclistas em relação aos pedestres.

Entre outras normas, destaca-se a que define que os ciclistas têm prioridade sobre os veículos automotores e os pedestres têm prioridade sobre os ciclistas. Isso significa que os veículos de maior porte são sempre responsáveis pela segurança dos menores, os motorizados pelos não motorizados e, juntos, pela segurança dos pedestres.

Além disso, segundo o CTB, nas vias urbanas e rurais de pista dupla, a circulação de bicicletas deverá ocorrer, quando não houver ciclovia, ciclofaixa ou acostamento, ou quando não for possível a utilização destes, nos bordos das pistas de rolamento, no mesmo sentido da circulação regulamentada para a via, com preferência sobre os veículos automotores. A autoridade de trânsito poderá autorizar a circulação de bicicletas no sentido contrário ao fluxo dos veículos automotores, desde que dotado o trecho com ciclofaixa.

Quanto aos pontos negativos da blitz, ou seja, contra a blitz, não vislumbro qualquer apontamento, devido a ação ser educativa e de conscientização.

Portal do Trânsito – Que outros pontos ou temas podem ser trabalhados em uma blitz para ciclistas que não foram abordados na referida ação?

Mércia Gomes –  Por exemplo, o uso do capacete não é obrigatório, mas é recomendado. Além disso, e não menos importante, o ciclista deve saber os locais – e regras gerais- para que possa transitar de bicicleta com segurança.

Outras informações importantes: o ciclista deve utilizar roupa com cores que chamem a atenção. E, também, precisam ter ciência de seus deveres, além dos direitos estabelecidos.

São apontamentos de suma importância que têm como objetivo evitar acidentes graves e mortes.

Destaco que essas ações, como a realizada pela EPTC, servem, também, para mapear os locais que ciclistas percorrem e identificar as dificuldades que enfrentam, para então realizar melhorias na mobilidade urbana.

Portal do Trânsito – Qual é o órgão responsável por fiscalizar o comportamento dos ciclistas na ciclovia?

Mércia Gomes – Essa determinação está no artigo 24 do CTB, que diz que compete aos órgãos e entidades executivos de trânsito dos municípios, no âmbito de sua circunscrição:

 I – cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito de suas atribuições;

II – planejar, projetar, regulamentar e operar o trânsito de veículos, de pedestres e de animais e promover o desenvolvimento, temporário ou definitivo, da circulação, da segurança e das áreas de proteção de ciclistas;

Atualmente, não há regulamentação para que o ciclista seja autuado por alguma conduta irregular no trânsito. 

Portal do Trânsito –  É possível denunciar um ciclista que comete alguma infração? O que pode ocorrer? 

Mércia Gomes –  Claro! Quem presenciar, pode e deve procurar um agente de trânsito para fazer a denúncia. Nesse caso, o ciclista receberá a devida orientação. Conforme esclarecido acima, nosso sistema não possui mecanismo de inserção de informação quanto à infração de trânsito por ciclista. Ou seja, precisaria ser regulamentado um sistema onde as bicicletas teriam registro como placa de veículo e CPF do condutor, a fim da devida autuação. No entanto, isso não existe no Brasil.

Dessa forma, a denúncia é cabível como educativa e se ocorrerem outros fatores mais graves, ela poderá ser encaminhada para um Distrito Policial através de um agente.

Portal do Trânsito – Podemos dizer que, no Brasil, realizar blitz em ciclovia é necessário ou não?

Mércia Gomes – Com certeza é necessário e tem sido positivo! Os ciclistas estão sendo educados e tendo acesso, de alguma forma, à legislação no trânsito.

As blitze educativas são tão importantes quanto os projetos de diminuição de acidentes envolvendo ciclistas. Observa-se nas grandes cidades um número alarmante- e em crescimento- de sinistros envolvendo esses usuários do trânsito.  

No Brasil, o uso da bicicleta teve um aumento considerável durante a pandemia. Depois disso, muitos mantiveram esse hábito seja pela qualidade de vida, melhora no sono, disposição durante o dia de trabalho ou pela própria mobilidade. Portanto, essa ideia da blitz em ciclovia poderia se estender para outras cidades e regiões.

Portal do Trânsito – Quais são as suas considerações finais?

Mércia Gomes –  Menciono, para finalizar, os acessórios obrigatórios para os ciclistas, como fonte de informação e segurança. O art. 105 indica como obrigatórios para bicicletas: campainha, sinalização noturna dianteira, traseira, lateral e nos pedais, e espelho retrovisor do lado esquerdo.

Reforço também que embora o uso do capacete não seja obrigatório pelo CTB, o ciclista deve usá-lo, pensando na sua própria segurança.

Além de todos esses pontos, o CTB também prevê que é obrigação do dos governos federal, estadual e municipais tomarem medidas que criem condições de circulação segura para as bicicletas.

Sair da versão mobile