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21 de novembro de 2024

Novo aumento no limite de pontos na CNH pode parecer benéfico, mas não é. Entenda!

PL pretende aumentar para 80 pontos o limite para que o condutor que possui o EAR na CNH tenha o direito de dirigir suspenso.


Por Mariana Czerwonka Publicado 09/09/2024 às 08h15
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Nova lei pontos CNH
Os índices reais de infrações, por tipo de veículo, tem têm alta correlação estatística com os índices oficiais anuais de sinistros de trânsito, por tipo de veículo. Foto: alevecchi@gmail.com para Depositphotos

Conforme publicamos há pouco tempo, como você pode ver aqui, começou a tramitar na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 2002/24 que pretende aumentar para 80 pontos o limite para que o condutor que possui o EAR (Exerce Atividade Remunerada) na Carteira Nacional de Habilitação (CNH) tenha o direito de dirigir suspenso, independentemente da natureza das infrações cometidas. A proposta é da deputada Carla Zambelli (PL-SP).

Ainda de acordo com o PL que prevê novo aumento de pontos na CNH, o motorista profissional ainda poderia participar de curso preventivo de reciclagem sempre que, no período de 12 (doze) meses, atingir 70 (setenta) pontos, conforme regulamentação do Contran e, dessa forma, não ter a CNH suspensa.

Na sua justificativa, a deputada argumenta que os motoristas profissionais, encontram-se em situação de vulnerabilidade porque, devido aos radares, eles acumulam facilmente os pontos necessários para aplicação da suspensão da habilitação. “Em 2020, o Congresso aprovou a elevação do limite de pontuação para esses profissionais, mas essa mudança ainda é insuficiente, pois, devido à quantidade de horas que dirigem, eles estão mais expostos à fiscalização e, consequentemente, às infrações”, opina Zambelli.

Novo aumento de pontos na CNH parece benefício, mas não é

O Portal do Trânsito & Mobilidade ouviu diversos especialistas na área que, de forma unânime, alertam sobre o perigo da implementação dessa medida.

De acordo com Renato Campestrini, advogado especialista em Trânsito, Mobilidade e Segurança, o argumento de indústria de multas não se sustenta, na medida em que o número de agentes e equipamentos fiscalizadores é infinitamente inferior ao número de infrações cometidas nas vias públicas.

“Pode parecer uma vantagem para quem trabalha no dia a dia no trânsito, entretanto, pelo que temos vislumbrado nas vias urbanas e rodovias desde que a flexibilização nas regras, que  dobrou a pontuação em 2021 foi colocada em prática, houve um aumento no número de sinistros de trânsito graves e fatais, refletindo em vidas desperdiçadas e onerando a sociedade”, pontua.

Ele diz ainda que se espera um comportamento exemplar de quem exerce atividade remunerada ao volante, pois o motorista tem um diferencial de conhecer, como poucos, o dia a dia do trânsito. “Preservar vidas no trânsito é medida urgente no nosso país, em especial pelo fato de estarmos a vivenciar a segunda década de ações para a segurança viária e o Plano Nacional de Redução de Mortes e Lesões no Trânsito – PNATRANS que visa reduzir em 50% o número de mortes no trânsito”, lembra Campestrini.

Compromisso com a segurança

Mesmo entendimento possui Paulo Pêgas Ferreira, diretor-presidente do Instituto Zero Morte para a Segurança em Transportes. Para ele, o fato do motorista ser profissional exige um maior compromisso com a segurança ao volante, e isso está associado ao cumprimento de todas as normas e regras de trânsito. “Não há qualquer fundamento que possa distinguir um motorista profissional dos demais, e que possa fundamentar sua isenção ou maior flexibilidade nas penalidades previstas pelo CTB”, diz.

O especialista faz um comparativo sobre a quantidade de óbitos envolvendo veículos leves x caminhões e ônibus em rodovias federais, no período entre 2012 e 2021, segundo a Polícia Rodoviária Federal (PRF).

Figura 1  Óbitos envolvendo veículos leves (automóveis) em rodovias federais – Fonte PRF

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Figura 2 – Óbitos envolvendo veículos pesados (caminhões e ônibus) em rodovias federais – Fonte PRF

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De acordo com Paulo Pêgas, comparando os dois gráficos, percebe-se que os tipos de sinistros que mais matam ocupantes de ônibus e caminhões são colisões frontais, que em sua maioria, são motivadas por ultrapassagem proibida ou com elevado grau de risco, que acontecem justamente em pontos onde não existe vigilância.

“Assim, pode-se inferir que há um relacionamento direto entre a imprudência e a certeza da impunidade neste perfil de condutores (profissionais). Por isso, entendo que o aumento da pontuação para 80 pontos irá incentivar ainda mais atitudes irresponsáveis que colocarão em risco não somente suas vidas, mas a de inocentes”, justica.

Epidemia de sinistros

Daniel Bassoli, engenheiro mecânico, diretor da Federação Nacional da Inspeção Veicular (Fenive), diz que atualmente vivemos uma epidemia de sinistros de trânsito.

“O Pnatrans veio como um compromisso do Brasil para reduzir mortes e lesões no trânsito, o que coloca em xeque qualquer iniciativa para flexibilizar a segurança viária. Aumentar o limite de pontos para aqueles que exercem atividade remunerada, logo estes que estão sujeitos aos maiores riscos de sinistros, nos parece, no mínimo, irresponsável”, analisa.

Para o especialista, a solução seria outra. “O legislador deveria pensar em criar mais condições de segurança e conforto para estes motoristas, gerando maior consciência sobre a necessidade da direção segura, reduzindo as infrações pelos profissionais do volante. Assim, poupamos vidas e evitamos os enormes custos relativos aos sinistros de trânsito”, argumenta Bassoli.

Mais infrações = mais sinistros

Horácio Figueira, consultor em Engenharia de Trânsito, faz um questionamento aos legisladores. “Imagine fazermos a mesma analogia com o transporte por avião comercial de passageiros ou de carga, com viagens diárias, por piloto? Quem tem muitos pousos e decolagens ou quilômetros percorridos, pode cometer “mais infrações” que um piloto que só viaja uma ou duas vezes por mês?”, pergunta.

O especialista lembra também do custo unitário real dos sinistros fatais e não fatais. Além disso, o total que os brasileiros “pagam” sem saber e sem reclamar, pois também são coniventes, consciente ou inconscientemente. “Hoje a conta deve estar em torno de 200 bilhões de reais por ano, o que dá uma média de cerca de R$ 1.000,00/ano por brasileiro ou R$ 3,00/dia”, diz.

Figueira relata que há 23 anos já tinha constatado, com pesquisas, que na cidade de São Paulo os índices reais de infrações, por tipo de veículo, têm alta correlação estatística com os índices oficiais anuais de sinistros de trânsito por tipo de veículo. “As motos (seus condutores) têm os maiores índices de infrações (mais de 70% dos observados) e, em consequência, os maiores de sinistros no trânsito”, aponta.

Para ele, a conclusão é muito simples.

“Ou reduzimos os índices reais e absurdos de infrações, de todos os tipos de condutores, ou continuaremos a contar os mortos e mutilados e ainda vão continuar a chamar de ACIDENTE!”, conclui o especialista.

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