A Semana Nacional de Trânsito 2021, que começa hoje em todo país, traz como tema “No trânsito, sua responsabilidade salva vidas”.
A Semana Nacional de Trânsito 2021, que começa hoje (18) em todo país, traz como tema “No trânsito, sua responsabilidade salva vidas”. No entanto, as autoridades brasileiras parecem ter esquecido o pacto assinado em 2009 com as Organizações das Nações Unidas em que o país se comprometia a participar da Década de Ações para a Segurança no Trânsito, entre 2011 e 2020.
A iniciativa tinha como meta reduzir pela metade o número global de mortes e lesões no trânsito em todo o mundo. Na época, o Brasil aparecia em quinto lugar entre os países mais violentos no trânsito, com cerca de 35 mil mortes por sinistros de trânsito.
O documento da ONU, elaborado a partir de um estudo da Organização Mundial de Saúde (OMS) mostrou que, apenas em 2009, foram registradas cerca de 1,3 milhão de mortes e 50 milhões de pessoas feridas vítimas de acidente de trânsito em 178 países.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as taxas de mortalidade por 100 mil habitantes por sinistros de trânsito de 2010 e 2019 foram, respectivamente, 22 e 15,2 nesses anos. Enquanto os dados preliminares do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS) não mostram redução significativa no número global de mortes em 2020.
Trânsito em tempos de pandemia
O diretor executivo da Federação Nacional da Inspeção Veicular – FENIVE, Daniel Bassoli, ressalta que não houve a esperada queda da estatística durante a pandemia de Covid-19. Apesar da redução drástica da circulação de pessoas devido ao isolamento social em 2020, não houve diminuição significativa na taxa de sinistros com motocicletas.
Relatórios de mobilidade da Google apontaram uma redução entre 60% e 80% dos deslocamentos em março de 2020 em relação ao início do mesmo ano. Mas o número de sinistros com motos reduziu somente 7%.
Leia mais
Em plena pandemia, SUS bate recorde de atendimento a vítimas do trânsito e motociclistas são maioria
“O trânsito é uma pandemia silenciosa no Brasil, que mata diariamente e, infelizmente, é um problema que já foi banalizado. Além disso, é uma questão que, talvez pela falta de maior publicidade, não sensibilize a população”, avalia.
Bassoli enfatiza que pouco foi feito visando a redução no número de acidentes nos últimos dez anos. De acordo com ele, se a atuação das autoridades de trânsito e dos órgãos de fiscalização fosse mais efetiva, cumprindo as ações que foram sugeridas naquela época, mais vidas teriam sido poupadas. Da mesma forma, o impacto financeiro aos cofres públicos seria muito menor. “Apesar de a pandemia ter impactado a economia e o setor de transportes e mobilidade, não contribuiu para a redução de mortes e lesões no trânsito”, opina.
O diretor ressalta que uma nova oportunidade será buscada com a nova década de ação para redução de acidentes de trânsito, entre 2021 e 2030. A iniciativa contou com a contribuição da FENIVE com a elaboração de atividades em prol da segurança veicular. Dessa forma, incluindo a viabilização do programa nacional de inspeção da frota de veículos, previsto no CTB desde 1997. Bem como, a implementação das ações do Plano Nacional de Redução de Mortes e Lesões no Trânsito (PNATRANS), que acaba de passar por consulta pública no antigo Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). Lembrando que agora o Denatran foi transformado em Secretaria Nacional de Trânsito.
Despesas que poderiam ser evitadas
A nota técnica Impactos Socioeconômicos dos Acidentes de Transporte no Brasil no Período de 2007 a 2018, realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), mostrou que o Brasil gasta cerca de R$ 130 bilhões ao ano com despesas hospitalares e patrimoniais decorrentes dos sinistros de trânsito. Nessa conta não estão computados os gastos previdenciários resultantes das mortes e perda de geração de riqueza pelos acidentados.
Motociclistas
Uma das categorias mais vulneráveis no trânsito brasileiro é a de motociclistas. Por exemplo, os usuários de moto foram as principais vítimas das ocorrências ao longo de 2020, quando os serviços de entrega rápida aumentaram significativamente e de forma inesperada.
Em 2018, registrou-se 11.136 óbitos em acidentes envolvendo motociclistas (ou passageiros) e 7.171 mortes nos acidentes com automóveis, segundo o levantamento do IPEA. “O número de motos nas ruas aumentou de forma desproporcional, o que refletiu no aumento de acidentes. Muitas delas circulam sem a realização de inspeção para comprovar se estão em boas condições de manutenção, conforme prevê a Resolução Contran 356 e o Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Nesse sentido, a possibilidade de circulação em velocidades mais elevadas, juntamente com a pouca fiscalização, facilitam a ocorrência de sinistros com motos”, alerta o diretor da FENIVE.
Se em números as motos são responsáveis pelo topo do ranking nas estatísticas, no quesito gravidade dos acidentes, o primeiro lugar fica com os veículos pesados, como é o caso dos caminhões.
Bassoli lembra que as ocorrências que envolvem caminhões sem freios ou com outros problemas mecânicos viram notícia diariamente em todo o Brasil. E, ainda assim, não há intervenção efetiva das autoridades para mudar esse cenário.
“Os órgãos de trânsito federais, estaduais e municipais sequer têm estatística específica sobre o assunto. A exceção é a Polícia Rodoviária Federal, que estima cerca de 6% de sinistros ocorridos por falhas mecânicas nas rodovias que monitora. Em outras palavras, a falta de dados impede inclusive a elaboração de políticas públicas efetivas para se trabalhar numa solução”, argumenta.
O diretor defende a necessidade de o Brasil resgatar a essência da iniciativa firmada com a ONU. Além disso, reunir todas as entidades do Sistema Nacional de Trânsito para trabalhar, de forma integrada, em todas as frentes. “É necessário desenvolver ações educativas, de fiscalização, orientação em todas as esferas governamentais. Além disso, o cidadão brasileiro precisa entender que o trânsito é responsabilidade de todos. Desde o pedestre que circula pelas ruas até o empresário dono de uma frota de caminhões que trafega por todo o país”, reforça e finaliza.