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26 de dezembro de 2024

As propagandas, o (des)respeito à vida e a segurança no trânsito


Por Márcia Pontes Publicado 27/11/2013 às 02h00 Atualizado 02/11/2022 às 20h40
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Propagandas de veículos

Uma propaganda totalmente indigesta da cadeia de fast food Bobs, de tanto que caminha na contramão da realidade do trânsito do nosso país, trata o seu público alvo e a sociedade como bobos.

É assim que vejo o comercial de 30 segundos que anda sendo veiculado Brasil afora, em que um rapaz atravessa a faixa de pedestres totalmente distraído, parecendo hipnotizado pelo lanche que se prepara para comer que nem percebe uma daquelas carretas impossíveis de não se perceber.

Do alto de um prédio um super-herói avista a cena, salva o lanche e deixa o rapaz ser atropelado. Herói é o título do comercial que no final ressalta o slogan “Não dá prá controlar”.

E a pergunta que faço é: dá para controlar os abusos e a falta de critérios em certas propagandas que se fazem no Brasil? Me parece que está havendo uma inversão de valores muito perigosa em que um lanche de fast-food tem mais valor que a constante banalizada vida humana, além de ser uma baita piada sem graça com os atropelamentos e com o art. 69 do CTB. O mesmo artigo que diz que o pedestre deverá tomar todas as precauções de segurança, levando em conta, principalmente, a visibilidade, a distância e a velocidade dos veículos.

Realmente, uma estratégia de mídia que representa uma ofensa num país como o nosso em que a cada 7 minutos uma pessoa é atropelada no trânsito. Fico imaginando o que uma vítima de atropelamento sente quando se brinca com um assunto tão sério.

E o que dizer das propagandas apelativas para vender mais carros e que os associam aos ideais de felicidade, status, poder, supremacia individual, numa sociedade que já valoriza que chega o ter em detrimento do ser?

Lembro de um slogan assim: segurança, conforto, estabilidade. Tudo que uma mulher procura em um homem e o que um homem procura em um carro. Mas, que triângulo amoroso é esse?

Propagandas que se referem a “um carro chamado desejo”, “amor à primeira vista” e “um dos maiores prazeres que você pode ter” dão a ideia de que o carro é mais amado do que o parceiro num relacionamento. E fecha com o chavão: “brasileiro é apaixonado por carro”.

Quem fiscaliza as propagandas no Brasil deixa passar slogans e propagandas que trazem a emoção da velocidade como mensagem subliminar em comerciais que afirmam que o carro é a “emoção em movimento”.

Há comerciais que tentam convencer as pessoas de que comprando tal carro elas ficam mais inteligentes, como é o caso de um que diz: “a inteligência não tem tamanho.”

Outros, tentam associar o carro ao estilo das pessoas e dizem: “ou você tem ou você não tem.”

“A Máquina Total” e “O carro mais potente do Brasil” são slogans que chamam a atenção de quem exige mais de um carro do que a sua verdadeira utilidade, que é facilitar a vida das pessoas que precisam transportar e serem transportadas por um carro.

E as propagandas que prometem mudar até a personalidade do motorista com slogans do tipo “deixe a pessoa que você era para trás”?

Destaque, visibilidade e fazer sentir-se melhor do que os outros quando dizem em tom imperativo: “saia do lugar comum e entre em tal carro” ou “Meu carro é número 1” são outros arrotos de arrogância e exibicionismo relacionados ao carro.

O fato é que as pessoas não são o que tem e muito menos o carro que elas tem. Pessoas são vidas humanas se locomovendo sobre rodas ou a pé no trânsito e precisam ser respeitadas. Não é o carro que faz o motorista, mas sim o motorista que faz o carro dirigindo com prudência, cuidado e respeito à vida.

Nada contra as montadoras, as marcas ou contra quem pode e quer ter um carro com características específicas. O que não se pode aceitar é essa apologia ao veículo que acaba distorcendo valores, associando ideais de felicidade às coisas e não aos valores e as pessoas.

Não adianta o Denatran escolher as frases de mensagens educativas que tem de aparecer em letras minúsculas nas propagandas de empresas automobilísticas de acordo com a Portaria 470 e punir quem descumpre, se quem fiscaliza as propagandas no Brasil não coíbe os abusos?

Eu sou do tempo em que os super-heróis viviam para fazer o bem, para salvar a vida das pessoas e não se corrompiam por nada, muito menos por um sanduíche. Mas, parece que até o papel dos super-heróis está sendo mudado pela indústria do consumismo.

Nunca é demais lembrar que a vida humana é o bem maior a ser tutelado, principalmente em propagandas que tenham a ver com o trânsito e que a busca pela criatividade não deve afrontar o bom senso. Precisamos de mais empresas em todos os segmentos que coloquem a segurança no trânsito como marca da sua responsabilidade social.

Neste ponto, não seriam certas propagandas mais um alerta do que um apelo comercial? Afinal, se me oferecem um produto que me faz ficar mais distraída e colocar a minha vida em risco, muito obrigada. Dispenso.

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