17 de dezembro de 2025

O Dia Mundial em Memória às Vítimas do Trânsito na visão dos familiares


Por Márcia Pontes Publicado 17/11/2016 às 02h00 Atualizado 02/11/2022 às 20h23
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cruzesO dia 20 de novembro terá nos cinco continentes algum tipo de manifestação ou celebração em respeito aos que se foram cedo demais e aos sobreviventes da violência no trânsito e seus familiares. A iniciativa é multissetorial: participarão os agentes de trânsito, os socorristas, os médicos, os bombeiros, os funcionários públicos, médicos, traumatologistas, psicólogos, cidadãos e todas as demais pessoas de bem sensibilizadas pela dor de quem perdeu o seu ente querido na via ou cuida dele, sequelado permanente ou não. Em Blumenau ergueremos um memorial. Muitos tiveram perdas recentes e ainda é muito difícil sequer tocar no assunto. Pergunte às vítimas. Pergunte às famílias das vítimas qual o significado deste dia tão importante em que se celebra a vida e se tenta sensibilizar para a conscientização os condutores e os governos e suas pastas acerca dos investimentos para poupar vidas.

O tema do Dia Mundial deste ano tem tudo a ver com um dos principais pleitos, desejos, anseios e esforços da sociedade brasileira e no mundo: o fim do sentimento de impunidade de quem mata e mutila no trânsito e continua solto, dirigindo e, muitos, reincidindo enquanto para as famílias resta uma dor e sofrimento que não acaba nunca! Atendimento às vítimas, investigação do acidente e punição para que algum tipo de alento em forma de justiça seja dado aos familiares e amigos enlutados. Essa também é a preocupação da ONU e da Federação Européia de Vítimas de Trânsito.

Pergunte ao filho que vai crescer sem o pai o que representa essa data. Pergunte aos pais órfãos de filhos, aos irmãos órfão de irmãos, mas não deixe de perguntar também à sociedade o que essa data representa além de cerimônias e monumentos.

Pergunte aos governos que gastam bilhões atendendo acidentes, recolhendo corpos, multiplicando sem poder leitos hospitalares e corredores, fazendo das tripas coração para dar conta se os investimentos em medidas cautelares para salvar vidas corresponde ao nível de sensibilização e de conscientização que pretendem demonstrar nas cerimônias.

Ocorre que depois que a cerimônia acabar muitos órfãos de vidas roubadas no trânsito voltarão para as suas casas e continuarão cuidando das vítimas sequeladas neurológicas. Outros, mergulharão no vazio da ausência, quem sabe contemplando alguma foto, peça de roupa ou para ouvir a última mensagem de voz que ele ou ela deixou confirmando o compromisso daquele dia ou mesmo para avisar que já estava chegando. Já faz tanto tempo, mas nunca tiveram coragem de apagar só para não perder a última coisa que restou: a voz grava de quem se foi e nunca mais vai voltar.

Realmente, o Dia Mundial em Memória das Vítimas de Trânsito é um dia para celebrar a vida, para lembrar e honrar a memória de quem se foi; para tornar a dor e o sofrimento público, para pedir por justiça e para que outras vidas não tenham o mesmo fim. É para não perder a esperança de que um dia isso acabe. Ou, para não perder a esperança de ver quem matou e feriu gravemente no trânsito pagar pelas consequências da imprudência e da negligência de seus atos.

São tantos os laços e as cores que simbolizam o engajamento a diversas causas pela vida! É tanta gente envolvida, engajada, empenhada! Mas, na prática, no dia a dia, continuamos abrindo cada vez mais caminho para as sirenes; continuamos cada dia mais recolhendo corpos e chorando outras mortes e sequelas que poderiam ser evitadas.

E assim seguimos pela vida, muitos, apenas respirando e “chamando” de acidente aquilo que sabemos que não foi acidente. Seguimos encontrando quem tirou a vida de quem amamos tanto em algum semáforo, lado a lado conosco, esperando o sinal verde para seguir em frente. Quem sabe em alguma balada, lanchonete ou pub segurando o copo em uma mão e a chave do carro na outra, como se nada tivesse acontecido.

Sabem porque é tão difícil para muitos familiares e amigos tentarem compreender o Dia Mundial em Memória às Vítimas de Trânsito? Porque não estamos na pele deles. Se estamos, nos identificamos, mas não precisaríamos ter perdido alguém para isso.

Em muito, foi a perda de familiares no trânsito que me trouxe para esse caminho e me fez vestir a segurança no trânsito como profissão e segunda pele.

Quem, assim como eu, perdeu alguém que ama no trânsito saberá bem do que estou falando e o quanto a nossa dor parece que nunca termina. Eu também tenho mortos no trânsito para lembrar e reverenciar a memória. Eu também tenho familiares e irmãos sequelados para lembrar neste dia, para agradecer pela vida deles e por não terem ido embora cedo demais.

E quem não tem, ainda é tempo de olhar para o outro, de sensibilizar-se com a dor e o sofrimento do outro e compreender que os seus comportamentos e atitudes preventivas e seguras na vida e no trânsito podem salvar vidas.

Não precisamos perder quem mais amamos para encontrar o significado do Dia Mundial em Memória às Vítimas de Trânsito.

 

Márcia Pontes

Meu nome é Márcia Pontes, sou educadora de trânsito em Blumenau (SC), Graduada em Segurança no Trânsito na Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL) e colunista de assuntos de trânsito do Portal de Notícias Blumenews. Sou pesquisadora do medo de dirigir e dos métodos de ensino da aprendizagem veicular pelo método decomposto, desenvolvido na Suíça e difundido em autoescolas italianas.Em 2010 iniciei nas redes sociais um trabalho de Educação Para o Trânsito Online (EPTon) utilizando a força das mídias sociais (Orkut, Facebook, Blog, MSN, Twitter, Youtube) com foco no acolhimento emocional, aprendizagem significativa e dicas de direção defensiva, ética e cidadania no trânsito.Escrevo o Blog Aprendendo a Dirigir voltado para alunos em processo de habilitação nos CFC e para motoristas habilitados com dificuldades e medo de dirigir. O foco deste trabalho voluntário reconhecido internacionalmente leva acolhimento emocional, aprendizagem significativa e fundamentos de ética, cidadania e humanização do trânsito para evitar acidentes, sobretudo por imperícia.No ano de 2012 publiquei o livro digital Aprendendo a Dirigir: aprendizagem pelo método decomposto para evitar traumas e acidentes durante a (re)aprendizagem da direção veicular. Em 2013 publiquei o livro Aprendendo a Dirigir: um guia prático de exercícios para quem tem medo de dirigir.Sou apaixonada por trânsito, respiro, pesquiso cientificamente e vivo o trânsito com compromisso existencial. A principal luta da minha vida: contribuir para rever e atualizar os métodos de ensino da direção veicular no Brasil substituindo o adestramento do aluno e a memorização pela construção de conceitos e de significados sobre o ato de dirigir defensivamente.

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