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Habilitação: o processo não se resume a alunos e instrutores


Por Márcia Pontes Publicado 23/07/2015 às 03h00 Atualizado 02/11/2022 às 20h31
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Processo de habilitaçãoQuando se fala em sistema ou processo de formação de condutores no Brasil existe uma tendência aos dedos apontarem sempre em duas direções: ou para o instrutor ou para o aluno, onde está a maior visibilidade dos resultados. Assim, o discurso vai se construindo, ou em torno do nervosismo do aluno, considerado normal, que vai naturalizando as altas e sequenciais reprovações; ou em torno das práticas lineares dos instrutores. Ninguém lembra ou dá a devida importância aos demais pilares da formação no país: os órgãos de ponta do Sistema Nacional de Trânsito, que são quem ditam as regras; a falta de apoio pedagógico da maior parte dos Detran’s, a falta de planejamento estratégico e pedagógico da maior parte dos CFC’s e o distanciamento dos profissionais que deveriam orientar e trabalhar em conjunto com os instrutores.

Fala-se o tempo todo em sistema e processo de formação de condutores como se fossem a mesma coisa (e não são) e na hora de identificar o que está dando errado para buscar as soluções e executar as mudanças chega a ser injusto reduzir tudo ao papel do aluno e do instrutor, como se por trás deles não houvesse uma cadeia de responsabilidades e de responsáveis. As mazelas vão sendo expostas como resultados, quando na verdade, são sintomas da falta de coordenação, de integração e de contexto.

O sistema de formação de condutores no país identifica quem o compõe, quem são os responsáveis e quais são suas responsabilidades. Dá nome à cada uma das partes que formam o todo. É (ou deveria ser) um conjunto de elementos que interagem entre si com objetivos comuns formando um todo, e onde cada um dos elementos componentes comporta-se, por sua vez, como um sistema. As partes desse sistema deveriam estar unidas entre si com o foco nos mesmos objetivos claros e compartilhados. (ALVAREZ, 1990, p. 16).

Já o processo refere-se às ações coordenadas e interdependentes entre as partes que formam o sistema (cada um que forma o todo). Mas, em vez de pensarem e agirem de forma coordenada, mais parece que cada parte do sistema de formação de condutores no país trabalha separada. Em alguns momentos, parece que se digladiam entre si enquanto os resultados continuam sendo preocupantes.

Quando se busca no Google pelos descritores “Processo de formação de condutores no Brasil”, aparecem aproximadamente 455.000 resultados em 0,54 segundos, e quase todos os links se relacionam a altos índices de reprovação, condutores recém-habilitados envolvidos em acidentes, “ensinar” só para passar na prova como se este fosse o objetivo principal e não trouxesse consequências.

Quando mudamos os descritores para “acidentes com carro de autoescola” o Google nos retorna aproximadamente 260.000 resultados em 0,38 segundos, e em muitos deles o aluno e até o instrutor fica ferido ou morre. O que está acontecendo?

Quando você procura por “instrutor deixa aluno sozinho no carro” a ocorrência é de aproximadamente 141.000 resultados em 0,93 segundos. Se os descritores são: “Aluna de autoescola morre” tem-se aproximadamente 429.000 resultados em 0,53 segundos, e quase sempre as notícias vêm vinculadas a acidentes ou a questionamentos e defesas da própria categoria.

O que quero dizer com isso é que o processo de formação de condutores não se resume só ao candidato ou ao instrutor. Temos de lembrar que as práticas dos instrutores, embora dependam muito da formação, de atualização, do que eles pensam e acreditam, também dependem do planejamento estratégico-pedagógico do CFC, do apoio pedagógico e orientação que recebem ou deixam de receber.

O candidato não sabe dirigir, está aprendendo. Não se pode cobrar perícia, prática e habilidade de quem não sabe dirigir. E assim também vem decidindo os Tribunais nos litígios envolvendo acidentes com veículos de aprendizagem, ferimentos e mortes de candidatos ao longo do processo de aprendizagem. Já não estamos conseguindo evitar acidentes, mortes e feridos entre os recém-habilitados e isso é grave; quem dirá durante as aulas ao longo do processo de formação!

Para termos um processo de primeira habilitação que funcione e cumpra com o que se espera dele, as partes do sistema precisam atuar interdependentes, integradas e dentro da visão de contexto.  É disso que vai depender a qualidade e os resultados do processo.

As responsabilidades de cada um precisam ser identificadas e alinhadas para que tenhamos parceiros e não adversários. O corporativismo não pode ser egoísta e cego ao ponto de tentar negar e deixar de identificar o que está dando errado, até porque acobertar as falhas uns dos outros e dentro da própria categoria não é justo com quem se esforça para fazer a diferença e melhorar as coisas.

Só vociferar em rede social não adianta se na forma de pensar e de agir continua-se a fazer vista grossa para problemas recorrentes que afetam diariamente a sociedade.

Se é para apontar dedos, que seja para si mesmos. Não para se condenar, mas para se autoavaliar. Temos de continuar valorizando os bons profissionais (que são muitos) em todas as pontas do sistema e do processo, mas também não podemos continuar justificando o inaceitável.  O momento é de nos unirmos por um processo de condutores diferente deste que temos: ultrapassado, falho, decadente e corporativo até para esconder as falhas. Isso sim, ajuda a melhorar as coisas.

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