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A virtude moral de Aristóteles na repetição de boas práticas


Por Gisele Flores Publicado 12/06/2014 às 03h00 Atualizado 02/11/2022 às 20h36
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Virtude no trânsito

Virtude. Há quanto tempo não pensamos sobre o significado dessa palavra?

Aristóteles (384 aC – 322 aC) foi aluno de Platão e professor de nada menos do que ”Alexandre – O Grande” e, desde jovem, dedicou-se a refletir sobre as simples e, ao mesmo tempo, grandes questões da vida, prática atualmente quase abandonada, como, por exemplo, no caso do questionamento e do entendimento do que vem a ser a virtude.

Pra começo de conversa, a virtude não é singular em sua dimensão, podendo ser aplicado em diversos vieses, sendo que, neste artigo, vamos nos restringir somente ao esclarecimento da virtude moral no ambiente do trânsito.

A virtude é uma qualidade moral particular que denota a disposição de um indivíduo para praticar o bem, não se tratando de uma característica nata, ao invés disso se apresentando como uma forma de conduta, representada pela repetição constante de atos motivados pela vontade do homem em prol do bem.

Mas como podemos saber o que é o bem?

Em resumo, bem é a finalidade de toda a ação, princípio fundamental da teleologia (ramo da filosofia para o estudo dos fins, dos propósitos e dos objetivos).

Segundo Aristóteles, a busca do bem seria um dos diferenciadores do agir racional humano do agir bestial dos animais, portanto não agir de forma racional e não buscar o bem nos igualaria aos animais.

O bem não se define em si mesmo, se constituindo a partir da adequada junção de “bens” ou virtudes humanas, quais sejam a amizade, a prudência, a temperança, a generosidade, a paciência, a caridade, a humildade e a honra, entre outros. Essa junção se dá pela deliberação do indivíduo de acordo com o caso concreto, a partir de uma educação adequada e prática de ações racionais compatíveis com essa educação. Para Aristóteles, o racionalismo deveria controlar e ordenar a paixão e a repetição do agir pelo bem, o quê nos capacitaria à prática de atos justos.

Para ser “do bem”, na visão de Aristóteles, devemos ser úteis à comunidade na qual estamos inseridos, e, com nossa utilidade, seremos felizes. Nessa visão, a felicidade não é entendida como um estado, mas como um processo em constante desenvolvimento e aperfeiçoamento.

Considerando a falibilidade humana, em alguns momentos ou estágios, poderá o homem não agir de forma a alcançar o bem, ou de forma a alcançá-lo apenas parcialmente. Daí discorre com grande sapiência o filósofo ao caracterizar o virtuoso como aquele que vive pelo meio-termo entre o excesso e a falta, o quê caracteriza o estado de moderação. Virtuoso, portanto, não é o quê nunca errou, mas o que busca acertar, acertando em muitas vezes.

A partir do exposto, podemos depreender que, para alcançar a harmonia no trânsito, precisamos valorizar o hábito de agir em prol do bem comum, antes do interesse particular momentâneo. Isso se mostra até mesmo em pequenos atos de gentileza, como respeitar aquele que pretende cruzar uma faixa de pedestres, ainda que estejamos com pressa, ou não estacionar numa vaga reservada para idosos ou deficientes físicos, ainda que não existe nenhuma outra livre por perto.

No entanto, a cultura vigente valoriza o bem sucedido, a superexposição do célebre, o individualismo, a supremacia dos direitos sobre os deveres, o culto ao veloz e ao furioso, o levar vantagem em tudo, certo? (Lei de Gérson). Desse jeito, nada se pode imaginar diferente do que a situação que nos está posta.

O trânsito é um ambiente de interação que envolve diversos partícipes, muitos desconsiderados em várias circunstâncias, quais sejam os condutores, os pedestres, os ciclistas, os veículos de tração animal e humana (carroças) e os seres vivos (animais e vegetais). Todos devem ser respeitados em sua justa medida, outro conceito de Aristóteles que foge do senso comum, o do justo equitativo, pois compreende tratar os iguais de forma igual, mas os diferentes de forma diferente, protegendo os hipossuficientes e os vulneráveis, que é a intenção fundamental que reveste o nosso CTB (Código de Trânsito Brasileiro), como, por exemplo, em seu artigo 29 parágrafo 2º:

Art. 29. O trânsito de veículos nas vias terrestres abertas à circulação obedecerá às seguintes normas:

§ 2º Respeitadas as normas de circulação e conduta estabelecidas neste artigo, em ordem decrescente, os veículos de maior porte serão sempre responsáveis pela segurança dos menores, os motorizados pelos não motorizados e, juntos, pela incolumidade dos pedestres.

Costumamos frequentemente ouvir que o problema do trânsito decorre dos “outros”, os governantes e autoridades, os maus motoristas e motociclistas, os pedestres desrespeitosos e desatentos, os veículos que desgovernam ou falham, quase nunca confessamos sermos parte deste problema, sempre buscamos uma justificação para o nosso comportamento inapropriado.

Vamos reafirmar um contrato social (revisitando Jean-Jaqcues Rousseau) a fim de reconhecer contra todos (erga omnes) um conjunto de regras, mais especificamente de ordem ética e moral, a fim de estabelecermos uma ordem social que nos tire desse “estado de natureza”, onde todos parecem estar contra todos e prevalece o mais forte, onde cada indivíduo parece agir como um “lobo” do próprio homem (Thomas Hobes), para passar a assegurar a paz e a defesa comum no trânsito, o resultado para todos dependerá das repetidas ações individuais de cada um para o bem, ou seja, se cada um for virtuoso, todos passarão a ser, enfim gentileza gera gentileza (“Profeta Gentileza”).

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