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Especialista Celso Alves Mariano fala sobre a importância do tema da Semana Nacional de Trânsito


Por Mariana Czerwonka Publicado 23/09/2010 às 03h00 Atualizado 10/11/2022 às 18h55
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"Há muita preocupação com a lei de trânsito e nenhuma com a lei da inércia", Celso Mariano.Há muita preocupação com a lei de trânsito e nenhuma com a lei da vida, Celso Mariano.

Em comemoração a Semana Nacional de Trânsito, o Portal do Trânsito entrevistou o especialista em trânsito e diretor da Tecnodata Educacional, Celso Alves Mariano. Nesta entrevista ele fala sobre aspectos importantes sobre o tema “Cinto de Segurança e Cadeirinha”.

Acompanhe:

Portal – Celso, porque é importante que as pessoas debatam o tema Cinto de Segurança e Cadeirinha, ao menos na Semana Nacional de Trânsito?

Discutir este assunto permitirá esclarecer aos usuários do trânsito que há bons motivos para que se exija o uso destes dispositivos de segurança. A maioria das pessoas não percebe os riscos oferecidos pelo trânsito e, por não enxergar os perigos, não adotam atitudes preventivas. Leis como estas condicionam as pessoas a se protegerem de forma adequada. Elas estão baseadas em exaustivos estudos técnicos, que consagraram tais técnicas e equipamentos como altamente eficientes para proteger a vida. Mas por ignorar os motivos, muitos se revoltam, pensam que há uma conspiração pra vender os equipamentos ou os utilizam apenas para não tomar multas, o que é lamentável.

Portal– O uso do cinto de segurança, apesar de reduzir mortes em caso de acidentes, só foi difundido depois da obrigatoriedade imposta pela lei, e mesmo assim, no banco de trás, poucos utilizam. Você acha que o uso da cadeirinha vai pelo mesmo caminho?

Esse fenômeno indesejável, no caso do cinto de segurança, ocorreu porque a implementação falhou no quesito educação. Muitas pessoas fazem o certo – usar o cinto – pelo motivo errado: não tomar multa. Sempre que uma evolução na legislação é implementada somente pelo esforço legal, ou seja, a lei e sua aplicação, há o risco de se criar distorções que nada ajudam no alcance do objetivo maior, que é evitar que as pessoas se machuquem ou, pelo mínimo, diminuir as consequências dos acidentes. O cidadão adotaria o comportamento preventivo – todos usando o cinto – na medida em que compreendesse os motivos por trás da lei, porque é assim, para quê serve e quais seus benefícios. O que faltou foi educar. Até mesmo a comunicação, a disponibilização da informação correta, base e início de qualquer processo educativo, falhou. Como resultado, desastroso, a lei do cinto só “pegou” para o banco da frente, onde o agente de trânsito “consegue ver” se o dispositivo está sendo utilizado. Assim, a proteção dos ocupantes será sempre parcial ou anulada, pois a pessoa do banco de trás pode, numa colisão, ser jogada contra os ocupantes que estão usando o cinto nos bancos da frente. São inúmeros os casos de graves ferimentos e de mortes por este motivo. Há muita preocupação com a lei de trânsito e nenhuma com a lei da inércia. É uma mistura bombástica de falta de informação com falta de espírito cidadão: as autoridades não se preocuparam em ensinar e o usuário não se preocupou em questionar os porquês da obrigatoriedade. No caso da cadeirinha há, pelo menos, muita informação disponibilizada. Espero que, por tratar-se dos próprios filhos, os pais e responsáveis estejam mais dispostos a entender os motivos da obrigatoriedade e consigam entender o incontestável benefício desta lei.

Portal – Por que é importante que as crianças sejam transportadas nestes sistemas de retenção (bebê-conforto, cadeirinha, assento de elevação)?

Porque no caso das crianças, para o cinto de segurança funcionar adequadamente, são necessários equipamentos complementares que compensem seu peso, tamanho e demais características físicas. As crianças não são apenas adultos em tamanho pequeno. Sua conformação física, sofreria traumas de forma diferenciada e específica, conforme idade, estatura e peso. Esta tecnologia já está muito bem estudada e definida. Não é à toa que virou padrão internacional, somente agora adotada no Brasil, infelizmente. Muitas crianças poderiam ter sido salvas não fosse este atraso. As estatísticas e os estudos técnicos mostram muito claramente o que acontece com pessoas soltas dentro dos veículos: ferimentos de gravidade proporcional ao impacto, levando muitas vezes à sequelas graves e à morte. As leis dos homens nem sempre funcionam bem. As da física, são implacáveis: quando o veículo para ou desacelera bruscamente, a energia cinética, ou seja, o conjunto de forças próprias daquela movimentação, são transformadas instantaneamente nas forças que esmagam, cortam, rasgam, machucam quem não está adequadamente acomodado dentro destas caixas de metal, plástico e vidro, de que são feitos os veículos. Só há duas saídas: ou ninguém se acidenta ou freia bruscamente – o que não dá para garantir – ou equipamos as pessoas com o recurso mais inteligente, simples, barato que a engenharia automotiva inventou: o cinto de segurança. Sem os sistemas de retenção temos uma situação tal qual acondicionar uma dúzia de ovos dentro de uma caixa de sapatos. Com todos os ocupantes, adequadamente protegidos, é como acomodar estes mesmos ovos numa embalagem daquelas com covinhas, onde os ovos se ajustam, sem bater nas paredes da caixa ou uns contra os outros. Por mais que o transporte da granja ao supermercado, e de lá até nossas casas, tenha acelerado, freado, parado, novamente acelerado e parado inúmeras vezes, os ovos chegam íntegros às nossas geladeiras. A vida é frágil. É preciso cuidado.

Portal- No Brasil, muitas entidades, só falam de trânsito nesta Semana. O que teria que mudar para termos uma efetiva mudança de comportamento da população em relação ao trânsito?

Termos no calendário uma semana dedicada a este assunto é ótimo. Mas é lamentável e perigoso pensar no trânsito somente em uma das 52 semanas do ano. Afinal, o trânsito e seus perigos, acontecem todos os dias. Não é difícil notar o indesejável efeito, em vários setores da sociedade, da cultura do “agora já fiz minha parte, só voltarei a pensar nisso no ano que vem”. O trânsito faz parte de nossas vidas de forma tão íntima, que costumamos não lhe dar a devida importância. Trânsito é a maior expressão da cultura, valores, organização e funcionamento da sociedade. Dele todos participamos. Não porque ele é democrático, mas porque é compulsório: simplesmente não há opção. Não dá para fazer uma “greve de trânsito”. Seria desistir de viver em sociedade. Direta ou indiretamente todos dependemos e participamos do trânsito. Até quando ligamos para pedir uma pizza em casa estamos interferindo no trânsito. E quanto mais complexo e perigoso ele fica, mais precisamos nos preparar para dele participarmos sem estresse ou acidentes. A diferença entre os países que têm o trânsito seguro e os que não têm, como é o nosso caso, vai muito além das questões de qualidade da frota, das estradas, da legislação e da fiscalização. É principalmente uma questão cultural. Precisamos de uma nova e mais adequada cultura em relação ao trânsito. Mudar a cultura só é possível, de forma sustentável, através da educação. E é bem aí que reside o nosso maior problema: confundimos campanhas com educação. Carecemos de programas, de políticas e ações estruturadas, com metodologia e ferramentas didáticas apropriadas para cada grupo, faixa etária e setor da sociedade. Não se muda a cultura de um país em pouco tempo, muito menos com uma ou outra campanha, apenas com alterações nas leis ou arrocho na fiscalização. Precisamos levar o assunto a sério, com responsabilidade e inteligência. Como cidadãos precisamos nos interessar pelo tema e exigir ações consistentes das autoridades. Quando chegarmos a este ponto, as “semanas do trânsito” terão o caráter de coroamento do que foi realizada ao longo do ano, e não mais a única semana do ano em que damos atenção para o assunto.

Saiba mais sobre a Semana Nacional de Trânsito, clique aqui.

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