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Cuidar da vida no trânsito é causa humanitária


Por Márcia Pontes Publicado 23/05/2014 às 03h00 Atualizado 02/11/2022 às 20h37
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Vida no trânsito é uma causa

Quando se fala em causa humanitária logo vem a mente campanhas mundiais como “salve as crianças africanas da fome”, “salve as meninas indianas de estupros”, “ajude os médicos sem fronteiras” e tantas outras causas nobres. Mas, considerando os mortos, feridos e sequelados em acidentes, temos pela frente a causa humanitária e o desafio de protegermos a vida no trânsito. A nossa e a dos outros.

O que torna os cuidados com a vida e a segurança no trânsito uma causa humanitária é que o trânsito é feito, acima de tudo, por pessoas, por vidas humanas e não pelos pseudo encouraçados de lata sobre motores e rodas.

Trânsito é feito de gente, até porque os veículos não saem por aí sozinhos. E é essa gente que conduz os veículos e que mais mata e morre no trânsito que transforma os acidentes em genocídio (assassinato deliberado de pessoas) e em problema de saúde pública.

Para a Organização Mundial da Saúde (OMS) os acidentes de trânsito são considerados epidemia, e já no ano de 1900, o Ministro do STJ, Viveiros de Castro, dizia que os acidentes automobilísticos já se constituíam uma epidemia tão mortífera quanto a febre amarela. Passados 114 anos, é difícil alguém morrer de febre amarela, mas em acidentes as mortes são diárias.

O que morre de pessoas no trânsito no Brasil dá para encher os 12 estádios da Copa do Mundo, o equivalente à queda de um avião da Malaysian Airlines por dia!

Por mais que se insista em olhar para as estatísticas como números e ao comentar as mortes diárias no trânsito como “mais uma”, não se trata de números nem de estatísticas, tampouco de percentuais. Tratam-se de vidas humanas que poderiam ser poupadas ainda tão cedo para que pudessem continuar entre nós, entre suas famílias órfãs. Para que continuassem simplesmente a viver.

Os acidentes de trânsito não escolhem suas vítimas, assim como quem morre nunca tem escolha diante da sentença imposta por alguém que cometeu uma infração que se transformou em acidente, dor e sofrimento.

Em minhas palestras e artigos procuro tratar o assunto sempre de forma cautelosa e respeitosa, pois nunca se sabe quem entre as pessoas está vivenciando o momento da perda de uma vida dessa forma.

Mortes no trânsito mudam o curso de tudo e vão até contra as leis da natureza que dizem que não é normal os pais, muitos deles idosos, enterrarem seus filhos.

O que caracteriza uma causa humanitária é a luta para proteger a vida de bebês, crianças, pessoas de idade mediana e idosos contra toda forma de opressão, de violência, de desumanidade, de atrocidades, de abusos e da afronta à dignidade e aos direitos humanos. Lembrando que a bandeira dos direitos humanos e de todas as causas humanitárias é a vida!

O que dizer, então, das consequências dos acidentes de trânsito (mortes, sequelas temporárias e permanentes, custos intangíveis) que ferem o mais humano dos direitos que é manter-se vivo?

Se pararmos para lançar um olhar sensível para o trânsito e as consequências dos acidentes veremos tanta ou mais opressão, violência, desumanidade, atrocidades, abusos e afrontas à dignidade humana do que em qualquer governo tirano ou guerras mundiais.

Ou será que atropelar, arrancar membros de ciclistas e jogar em valas fétidas para se livrar do “problema” não é uma afronta a dignidade humana?

Como deveríamos nos reportar ao ato de arrastar o corpo de uma mulher no asfalto abrasivo por cerca 800 metros e ainda tentar se livrar do corpo fazendo manobras com o carro? Barbaridade? Desumanidade?

Quando uma pessoa é atropelada e fica presa ao capô ou parabrisas do veículo e ainda assim o condutor continua dirigindo em fuga, o quanto de afronta à vida e tirania existe nessa violência?

Basta presenciar a fragilidade do corpo humano em um atropelamento para entender melhor sobre violência desmedida. Basta olhar para recém-nascidos e prematuros que receberão o primeiro carinho da estufa porque a mãe, ainda gestante, foi morta num acidente.

Basta um pouco de empatia para se colocar no lugar do outro, experimentar sentir por alguns instantes a dor do outro e imaginar que a dádiva de viver cada dia ao lado de quem amamos não existirá mais.

É por essas e outras que cuidar da própria vida e da vida dos outros no trânsito é uma causa humanitária para a qual a doação não é por telefone, em moedas ou cartão de crédito. Basta resgatar a sensibilidade e a humanidade escondida em alguma dobrinha de si mesmo e trazer isso para as práticas diárias.

Antes eu era só educadora de trânsito. Evoluí e agora sou ativista da causa humanitária de salvar a minha própria vida e a dos outros no trânsito.

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